Livro aponta que Machado de Assis criou uma psicologia nova por meio da literatura
Psicólogo e engenheiro Adelmo Rossi lança o livro “O imortal Machado de Assis: Autor de si mesmo”, no dia 14 de maio, na Biblioteca Pública Estadual
No livro “O imortal Machado de Assis: Autor de si mesmo”, o engenheiro, psicólogo e escritor Adelmo Marcos Rossi faz uma extensa análise da literatura de Machado de Assis, considerado o maior escritor brasileiro, e descobre nela uma estrutura de conceitos semelhantes aos criados posteriormente por Freud. O livro terá lançamento no dia 14 de maio, às 19h, na Biblioteca Pública Estadual, em Vit& oacute;ria.
De acordo com Adelmo Rossi, Machado de Assis (1839-1908) teria antecipado, por meio dos personagens dos seus romances, contos, peças de teatro, além das crônicas e críticas, os conceitos que Sigmund Freud (1856-1939) viria a popularizar alguns anos mais tarde através da psicanálise. O autor se apoia em ampla pesquisa para defender que o Bruxo do Cosme Velho, como Machado de Assis ficou conhecido, estabeleceu uma espécie de “psicologia literária”, na qual demonstra as tramas do envolvimento psíquico, tendo como base a sua percepção do conceito do Narcisismo que somente viria a ser descoberto po r Freud em 1914.
Fundamentos
Na leitura de Adelmo Rossi, o Narcisismo foi tomado como princípio da psicologia literária daquele que se tornou o maior escritor brasileiro, já na publicação do seu primeiro conto, “Três Tesouros Perdidos” (1858), quando tinha 19 anos de idade, pelo efeito retorno que mostra. “Além desse conceito, Machado tomou para seu projeto literário outros fund amentos: Petalogia, Caiporismo, travessia do Rubicão, Lanterna de Diógenes, Pílades e Orestes, Prometeu no Cáucaso, Similia similibus curantur, Imortalidade, Originalidade, entre outros, com paralelos na psicanálise de Freud”, observa.
O autor conta que o seu interesse em torno das obras de Freud, e depois de Machado de Assis, teve início em 2003, quando ele deixou o emprego de engenheiro para se tornar empreendedor e a seguir adentrou no mundo da subjetividade. No ano seguinte, ingressou na graduação em Psicologia, formação que o levou naturalmente ao mestrado em Filosofia. A conclusão da sua dissertação, com o tema “Filosofia do Acontecimento”, concluída em 2015, o estimulou a pesquisar o Narcisismo dos autores, a partir de 2016.
Nas 456 páginas do livro, ele discorre sobre a similaridade entre as contribuições dos seus dois objetos de pesquisa, tendo como base a extensa obra machadiana, composta por dez romances, 215 contos, dez peças teatrais, cinco coletâneas de poemas e sonetos, e mais de 600 crônicas. Adelmo expõe as razões pelas quais considera Machado de Assis um escritor revolucionário, pontuando sua linha de pensamento com citações continuadas, extensas, desde o período inicial de formação na tipografia de Paula Brito, responsável por trazer ao público obras de escritores célebres da literatura brasileira no século XIX. Conclui ser impossível dissociar o escritor de sua obra ficcional. “Sabe-se que é uma estratégia comum o escritor se disfarçar em personagens para, pela licença poética, criar o Eu lírico. O próprio José Saramago afi rmou, no livro ‘Cadernos de Lanzarote’, que tudo é autobiografia”, comenta o autor.
Cartas
Adelmo cita o crítico literário Alcides Maya, autor do livro “Machado de Assis – Algumas notas sobre o humor”, de 1912: “O autor, na peça, transforma-se em ator, e este, entre os personagens que imaginou e move ao seu arbítrio, é, de feito, o personagem central, embora disfarçado”. Machado havia escrito algo semelhante no conto “Onda” (1867): “Este modo de traficar a própria pessoa não é nenhuma descoberta, nem eu me dou por Arquimedes”.
Por outro lado, estudando as cartas do jovem Freud, Adelmo Rossi nota que o estudante escrevia com habilidade literária semelhante à de Machado. Em uma entrevista datada de maio de 1934, Freud reconhece seu desejo de se expressar através da literatura. “Eu sou um cientista por necessidade e não por vocação. Sou, na verdade, por natureza, artista [...]. Meus livros, de fato, se parecem mais a obras de imaginação que a tratados de patologia [...] Eu tenho podido cumprir meu destino por uma via indireta e realizar meu sonho: se guir sendo um homem de letras, mesmo que sob a aparência de um médico”, declarou.
Apesar da correlação entre as obras, Adelmo Rossi não pode precisar se Freud foi apresentado aos escritos produzidos pelo escritor brasileiro: “Freud teve acesso à cultura humana do modo como ele mesmo cita no decorrer de sua obra. Como a psicologia está inserida na cultura, ele próprio afirmou que o escritor literário o havia antecipado pelo fato de conseguir dizer, de modo oculto, o que o homem comum dirá no consultório do psicanalista. O que por demais chama a atenção em
Machado é o fato de ele ter, para, além disso, criado conceitos muito próximos aos de Freud”, comenta.
Finalmente, segundo o psicólogo, o que teria dificultado a descoberta anterior das expressões conceituais em Machado seria o fato de o autor escrever nas entrelinhas. “Nesse sentido, foi uma grande surpresa vir a descobri-las”, revela Adelmo.
PROGRAME-SE:
Lançamento do livro “O Imortal Machado de Assis – Autor de si mesmo”
Autor: Adelmo Marcos Rossi
Data: 14 de maio
Horário: 19h
Local: Biblioteca Pública Estadual Levy Cúrcio da Rocha - Av. João Batista Parra, 165, Enseada do Suá, Vitória (ES), 29.050-375
Telefone: (27) 3137-9351
Edição do Autor
456 páginas
Preço: R$ 100,00
SOBRE ADELMO ROSSI:
Adelmo Marcos Rossi é engenheiro civil (1980), com mestrado em Ciência de Sistemas (Tóquio, 1988-1990), funcionário da Vale do Rio Doce por vinte anos (1980-2000), de onde saiu para se tornar empreendedor; graduou-se em Psicologia pela Ufes (2004-2010), com mestrado em Filosofia (2013-2015), com o tema Filosofia do Acontecimento, a partir do qual iniciou suas pesquisas sobre o Narcisismo. Publicou o livro “A Cruel Filosofia do Narcisismo – Uma Interpretação do Sonho de Freud” (Editora CRV, 2021).
TRECHO DO LIVRO:
Tudo o que existe no mundo, desde o início dos tempos, foi obra do ser humano, depende do seu Narcisismo, do amor por si mesmo, mover-se a construir objetos, imagens de si, na realidade.
Do ponto de vista da sobrevivência psicológica, o ser humano que viesse com o pensamento psicológico que veio Machado de Assis, dispensaria qualquer visita a psicanalista, pois já detinha a psicologia em si, estaria desde o princípio orientada a compreender a Vaidade como fundamento do agir humano, e que a subjetividade se escamoteia em todas as falas.
O ensinamento deixado é a difícil compreensão da divisão existente na fronteira da linguagem, na separação entre linguagem natural, objetiva, e linguagem figurada, metafórica, insinuativa, sempre apta a pegar qualquer pessoa desprevenida. Esse jogo de palavras será insistentemente explorado por Machado em sua obra literária.
O que difere entre o legado de Freud e o legado de Machado?
Em Freud, uma psicologia sob a forma conceitual que nomeou psicanálise, a qual deu origem a curso superior em faculdade de psicologia, algo que não existia, e que forma o psicólogo para a escuta dos dramas privados. Freud foi fundamental para a criação da profissão de psicólogo.
Machado não deixou esse instrumental para a criação de curso de psicologia, deixou, porém, uma psicologia sob a forma literária, onde mostra, mais que conceitua, as tramas do envolvimento psíquico.
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