Casal brasileiro lamenta repercussão de vídeo pelo mundo: 'Virei o sabotador da minha esposa'
Na manhã de 5 de maio, um domingo, a família Lourenção seguiu para a 2ª Meia Maratona de Presidente Prudente, no interior de São Paulo.
A personal trainer Luciana, de 37 anos, participou da competição, enquanto o marido, o empresário Pedro, de 43 anos, e as duas filhas do casal ficaram na torcida.
Luciana e Pedro, que estão juntos há 16 anos, dizem que havia um combinado: levar as filhas para cruzar a linha de chegada junto com a mãe.
Para isso, o empresário ficou com as crianças, de 3 e 6 anos, em um trecho que antecedia a chegada.
Mas a situação não ocorreu como o planejado, afirma o casal. Quando viu a mulher se aproximar, o homem seguiu com as filhas em direção a ela. No entanto, Luciana desviou das garotas e seguiu rumo à linha de chegada.
Ela explica que mudou a ideia inicial porque não esperava liderar a corrida feminina.
E quando viu que estava na frente, quis manter a colocação.
“Eu olhei as meninas, mas precisei desviar, porque a segunda colocada estava perto de mim e eu precisava cruzar a linha de chegada logo”, justifica a personal trainer.
O momento foi registrado em um vídeo que correu pela internet e teve repercussão em vários países.
Pedro passou a ser duramente criticado por ter colocado as filhas perto da esposa naquele momento.
“Não tenho palavras para descrever o quanto odeio esse marido. Deixa ela ganhar uma sem carregar culpa de mãe”, escreveu em inglês um perfil no X (antigo Twitter), em uma publicação que tem mais de 221 mil curtidas.
Em diferentes idiomas, Pedro passou a ser definido como um marido “tóxico” que tentou prejudicar a esposa.
Ele diz ter ficado assustado com a repercussão do vídeo e pela forma como a situação foi interpretada.
O casal afirma que o vídeo viralizou sem que as pessoas entendessem o contexto do registro.
“Foi assustador. As pessoas estavam com um discurso de ódio muito grande. Foi estranho, com um gosto difícil”, diz o empresário à BBC News Brasil.
A maratona
Pedro diz que foi o responsável pela inscrição da esposa na maratona em Presidente Prudente, cidade onde a família mora.
“A gente ia viajar no dia, mas desistimos da viagem em cima da hora. Então, fui atrás da organização da corrida para conseguir fazer a inscrição dela”, afirma.
Ele diz que sempre incentivou a esposa a participar de corridas.
“A gente corria junto antes, mas parei durante a pandemia”, afirma.
Luciana já havia participado de outras corridas na região. A personal afirma que sempre teve um bom desempenho, mas não esperava que fosse liderar aquela disputa de 5 de maio – a segunda colocada chegou 20 segundos depois.
“Por mais experiência que eu tenha em corrida, não estava preparada para aquela distância, era um percurso difícil (de 21 km) na cidade e eu não esperava vencer”, afirma.
O organizador da competição, o empresário Júnior Diesel, conta que foi procurado por Pedro cerca de 15 minutos antes da chegada de Luciana para que as filhas cruzassem a chegada com a mãe.
“Eu permiti, e ele ficou esperando ela passar”, diz.
Diesel afirma que entendeu a conduta de Luciana de se afastar das filhas, enquanto estava totalmente focada na disputa.
“Quem corre sabe que o foco é ganhar. Então, para nós naquele momento, não tinha acontecido nada absurdo.”
Quando cruzou a linha de chegada, Luciana comemorou com as filhas, com o marido e com os outros familiares que a acompanhavam, como o irmão dela – ele é o rapaz que aparece logo em seguida de Luciana no vídeo da chegada.
“Eu cumprimentei as meninas, esperamos o pódio e a situação [da tentativa de aproximação das filhas perto da chegada] passou batido. Mais tarde, até falamos sobre isso em família”, comenta.
“A minha filha mais velha perguntou: ‘Mamãe, você não conseguiu pegar a gente?’ E eu expliquei pra ela: ‘A mamãe estava muito cansada, a segunda competidora estava perto e passaria a mamãe se eu parasse pra pegar vocês’. E ficou tudo bem entendido e passou”, acrescenta.
A família não esperava que aquele momento fosse chamar a atenção das pessoas dias depois.
O vídeo viral
O vídeo foi publicado inicialmente no perfil do fotógrafo Sinomar Calmona, responsável pelo registro na maratona, e não teve grande repercussão.
Mas cerca de 10 dias depois, o vídeo começou a viralizar nas redes. O casal diz que não sabe o exato momento em que o registro começou a despertar a atenção das pessoas.
“De repente, várias páginas começaram a compartilhar”, diz Pedro.
Eles ficaram assustados ao perceber o principal motivo dos compartilhamentos: criticar a atitude do pai com as filhas enquanto a companheira se aproximava da linha de chegada.
As primeiras críticas, dizem, foram em páginas relacionadas à maternidade, muitas delas em inglês. Mas, depois, o vídeo foi propagado por vários tipos de perfis na rede e para diferentes públicos.
Atualmente, o vídeo acumula milhões de visualizações – só em uma publicação no X, há mais de 46 milhões.
“Eu sempre fui o cara que botou pilha para a Luciana crescer profissionalmente, e de repente me tornei o sabotador dela”, diz Pedro.
“Eu fui muito chamado de sabotador em diferentes idiomas e também disseram que eu queria apagar o brilho da minha mulher. Também falaram que não consigo cuidar das minhas filhas por uma hora. E ninguém sabia o contexto do vídeo”, acrescenta.
Luciana também chegou a ser criticada por algumas pessoas por não ter interagido com as filhas perto da linha de chegada. Mas ela frisa que a imensa maioria dos comentários foram críticas ao marido.
Ela diz que usaram pautas como machismo e desigualdade de gênero no cuidado com as crianças ao debater sobre o vídeo. Para a personal trainer, o momento foi usado em discussões que não tinham a ver com a situação registrada no vídeo.
“Colocaram em foco a relação da mulher com o homem. Mas acho que não precisava chegar nesse ponto de repercussão.”
Pedro afirma que foi vítima de um “discurso de ódio muito grande”.
“Ninguém me conhece ou sabe como sou em casa para a minha esposa e para as minhas filhas”, declara o empresário.
Após o susto inicial, o casal diz que quer tirar algo positivo da repercussão do vídeo.
“Agora, estamos mais tranquilos e tentando ao máximo tirar alguma coisa, em relação ao Instagram, para tentar divulgar o trabalho dela. Estamos tentando usar essa tempestade pra algo bom”, declara Pedro.
"Agora quero curtir o que for bom em toda essa onda. Quero usufruir do que puder pegar de bom, como os seguidores do Instagram e agora tentar alavancar mais o meu trabalho como personal trainer”, diz Luciana.